Alguma memória

Aqui vão alguns registros de memória do sertão que há dentro de mim.

terça-feira, 26 de abril de 2011

Pedro e o Projeto Minerva

Pedro de Alvino, ou simplesmente Pedro-dos-Pequis, era um desvalido que vivia com a mãe no sopé da Chapada do Araripe.  Na verdade, não sei até hoje como nem de quê ele e a mãe sobreviviam. Na safra do pequi, Pedro passava, manhãzinha, na estrada do Granjeiro com um saco enorme na cabeça em direção à feira. Vendidos os pequis, Pedro voltava pra casa, fim da tarde, começo de noite, bêbado de fazer dó.
Nessa hora, invariavelmente passava lá em casa. Os cachorros e o bafo de cachaça misturado ao odor forte do pequi o denunciavam ainda no terreiro. Tomava a bença à minha, pedia água, fósforos para acender um cigarro de palha que sempre trazia na orelha. Comia e levava uns pitos de minha mãe pelo estado lastimável de sempre.
Em 1970 o governo militar de plantão criou o “Projeto Minerva” (http://www.youtube.com/watch?v=Mz0gtsk0gCs). Foi, senão a primeira, uma das iniciativas pioneiras de educação à distância no Brasil. Acho quem em 73 ou 74 minha mãe passou a dar aulas no Minerva. O material didático era constituído de alguns lápis grafite, borrachas e cartilhas. Tinha também um Motorrádio do governo que ficava lá em casa era levado toda noite ao grupo escolar, que não tinha luz e era iluminado por um lampião a GLP (gás de cozinha). Pedro-dos-Pequis era um dos alunos. Todas as noites, como não tinha com quem ficar, eu ia com a minha mãe para escola. Uma diversão.
Lembranças daquele tempo são esparsas: a luz pouca, as cartilhas com letras pontilhadas para cobrir, a vinheta do programa, os lápis que sumiam entre os dedos grossos dos alunos-agricultores. Ficava orgulhoso de ser sempre o primeiro a terminar a tarefa. Naquele tempo eu também experimentava as primeiras letras. Eu segui. Pedro e os demais ficaram na sombra de Minerva.

4 comentários:

  1. Engraçado, quase todo lugar tem o seu "papudim" de estimação, com quem se mantem uma relação de chacota, temor e nojo encoberto de falsa pena. O da Rua Menino Deus, em Sobral, era o Fuscão Preto, morador de rua que andava sempre com as calças com um furo "bem nas partes", como dizia vó Noquinha. Um dia ele irritou o dono da bodega e levou uma surra de chicote de pimba de boi. Foi bater na Santa Casa e por lá ficou...

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  2. Parabenizo-lhe por seu trabalho de resgate dessas suas (nossas) lembranças e andanças pelos caminhos áridos do nosso sertão. Tenho certeza que esse diário não será "mais um blog" no infernal ciberespaço da Nova Era. Ficarei atento.

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  3. Pedro era mais que um papudim, era um cara que apesar de subir de uma forma que parecia ter caído num alambique, não fazia mal algum a quem quer que fosso;fazendo assim com que a emoção tomasse conta de nós cquando da noticia de sua morte. Ainda lembro da risada do velho pedro de aivino como a gente o chamava.

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  4. Olá, como posso entrar em contato? Estou Fazendo uma pesquisa sobre o Projeto Minerva, e estou em busca de alunos do Projeto. www.projetominerva.com
    abs

    Thiago

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