Manezim, Sorriso, Damião, Chico, Incha-Tetê e uma infinidade de outros doidos pontificavam na ruas do Crato no meu tempo de meninice. De alguns, lembro vagamente. De outros, até dos odores que exalavam por andarem ao léo, entregues à própria sorte e ao escárnio dos meninos.
Um moleque insultava: “Chico, cadê a noiva?” Estava dada a senha. A enorme bengala era girada a esmo, não importando quem estivesse por perto. Chico era cego e a molecada aproveitava para aperreá-lo justamente quando próximo a aglomerações. Muita senhora foi atingida a bengaladas.
Manezim é o de minha mais remota lembrança. Vivia bêbado e costuma gritar o seguinte bordão: “Ô cheiro de peixe. É o puro surubim!” Isso a plenos pulmões. Nunca soube o que queria dizer, se é que aquela frase lançada ao vento tinha algum sentido.
Sorriso era uma louca de dar dó. Surda-muda, perambulava pelas ruas e, segundo contavam os mais velhos, teria botado no mundo vários filhos que haviam sido tirados dela e adotados por famílias aprumadas. Todos fruto de estupros. Tinha esse apelido por ser desdentada e parecer estar sempre a sorrir, apesar da tragédia em que viveu mergulhada.

Jerrim, o engraxate da foto ai do lado (gentilmente cedida por W. Bernardo), ainda hoje está na ativa. Batizou-se assim, acredito eu, num misto de homenagem e admiração por Jerry Adriani, galã da Jovem Guarda. Tanto que na caixa em que carrega seus apetrechos pode-se ler: "Eu sou o Jerrim das meninas”. Um grande sujeito. Fã das velhas sessões de cinema do Cine Cassino Sul-Americano.
Éramos muitos os doidos daquele tempo.
"...Sou Jerry Adriani."
Tandô e Príncipe Ribamar ilustram o panteão dos doidos mansos do Crato. A sua Nobreza estava perfilada com seu manto de medalhas e calças com vinco vermelho no aeroporto para receber o aperto de mão do colega Balduíno, da Bélgica. Trabalhava de carpinteiro, profissão do Nazareno. Trazia sempre consigo fotos das namoradas: Brigit Bardot, Kim Novak, Elizabeth Taylor e outras beldades. Mostrava o cheque recebido de uma das atrizes, no qual os zeros davam a volta nos quatro lados do papel. Tandô se espritava com o apelido, erguia o cajado e jogava pedras. A rua era o hospício. Um amigo do meu pai o encontro na praça e contou que havia aderido à terapia do mijo, bebia o próprio xixi quentinho. Mais um doido na nossa contabilidade.
ResponderExcluirProcurei por toda Web uma foto de Tandô, pequeno preto com seu paletó cheio de penduricalhos. Quanto ao Príncipe Ribamar, bastava meus pais virem alguém mais produzido(qualquer um de nós, filhos) para tascar: "tá que é um príncipe ribamar". Valeu demais a lembrança. Tandô eu vi na Praça da Sé, O Príncipe, só na pilhéria de ou de outro familiar! Muito obrigado pela colaboração. Amo meus loucos!
ResponderExcluirLá pelas minhas bandas também tinha uns. A que mais me marcou foi uma que fez fama na cidade depois de ficar louca na minha casa. Sim. Ela morou anos com a gente, normalíssima. Até que a carta de um dito noivo a decepcionou e lhe tirou o juízo. Ficou doida de ser preciso esconder faca, ser internada, de sair dirigindo carro sem saber - e bater, claro. Passou anos assim, mas, como sempre, tratava a gente como filho. E sabe como ficou boa? Boa, boa mesmo. A mãe ficou cega e só tinha a filha para cuidar. Pronto. Taí a cura. Mas as histórias permanecem.
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