Dentre outros serviços de roça, Teó castrava animais. Era costume entre os moradores daquelas paradas a criação de porcos, galinhas, carneiros e outros pequenos bichos. Depois de cevados, geralmente em datas especiais, viravam banquetes. Para a criação engordar sadia, é costume castrá-la. É aqui que entra Teó.
O bicho a ser castrado era um porco, na verdade, um bacurim. Teó ficou de ir, mas não apareceu para fazer o serviço. Adiou para a semana seguinte, depois mais uma semana e mais uma... As desculpas eram: ‘a Lua’, que não estaria propícia, ‘uma inflamação’ que apareceu não sei em que parte do seu corpo, isso, aquilo.
Minha mãe passou a aperrear o juízo do meu pai: “O tempo está correndo, esse bicho tá crescendo. É já que passa da hora de fazer esse serviço. Vai atrás de outra pessoa....” O velho – que, faça-se justiça ainda não era velho naquele tempo – aporrinhou-se. Amolou uma faca e partiu com tudo em direção ao chiqueiro.
Antes, passou por um fogareiro velho, que só era usado em ocasiões especiais, e pegou um punhado de cinza. E me chamou: “Venha me ajudar”. Tremi. No chiqueiro, pegou o bicho pela orelha, atirou ao chão e disse: “Segure”. Em instantes estava o porquinho sem os seus bagos. A cinza é usada para prevenir inflamações.
Muitos anos se passaram. Arribei do Cariri. Andei pelo Planalto Central para depois me fixar em Fortaleza. Jornalista, me vejo atualmente obrigado, por dever de ofício, a acompanhar de perto a tragédia da violência e as suas consequências para a sociedade. Na base de tudo – ou de quase tudo – a droga, o crack.
Numa viagem de férias ao sertão, soube que o negrinho de olho vivo, filho de seu Teó, entrara para o crime. Usuário de drogas, virou ladrão. Seguiu os passos de Cézar, que era o filho mais velho do capador de bichos. Cézar foi meu contemporâneo e parceiro de partidas de futebol em campos de terra batida. Foi no tempo da ingenuidade. Morreu no crime, à bala. Do negrinho, de quem nunca nem sequer soube o nome, não tive mais notícias.
Teó, diante da desgraça que se abateu sobre seus meninos, piorou do diabetes. Não sei se ainda é vivo para além da minha lembrança.
Coisa triste, Henrique! Tanta pena do seu Téo. Tanta pena da gente que está vivendo nessa violência toda, meio que impotente. Tanta pena disso tudo que a gente quase endurece: "quase". Beijos
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