Alguma memória

Aqui vão alguns registros de memória do sertão que há dentro de mim.

quinta-feira, 2 de maio de 2013

Os irmãos de minha mãe

 Quando arribava um menino – filho sempre é menino – Maria Grande voltava os olhos para a estrada poeirenta e chorava. Com saudade do seu “tiquim de filho”. Era assim que ela os tratava, fossem dos grandes ou dos mais miúdos. José Grande, Sebastião, Joaquim, Antonio, Afonso, Luís, Raimundo e José Venilson (pequeno, já que mais novo). Todos arribaram. Um ou outro voltou.

Bastião. Tenho a impressão de que ele nunca se alterou.  Era um homem suave.
Um dia foi ao médico: “O senhor tem quantos anos?”, perguntou o doutor por trás de um raio-X.  -78...
“Fuma desde quando?” 
– 14.
“Seria bom ele para de fumar!” interveio minha mãe, que o acompanhava.
“Não. Não é mais necessário.”

Zé Grande eu conheci pouco. Foi pro Rio de Janeiro há muitos anos. Meu avô João prostrou-se numa rede quando deu conta da fuga. Pelo que ouvi falar, José morreu de tristeza após perder a filha Tereza para a depressão.


Os gêmeos vieram depois da tragédia: Maria Grande chorara e praguejara tanto que o Criador parece ter-se arrependido de tirar-lhe um filho de seis meses. Na barriga seguinte, nasciam  Joaquim e Antônio. Duas jóias. Joaquim é das aves que acertaram com a estrada de volta. Antônio arranchou-se no Paraná.

O namorador Afonso  gostava de pinga e de forró. Levou vida de gado. Sempre no lombo de um animal. Luís fez-se enfermeiro por onde andou. Patrulhou Suez, no Egito, pelas forças da ONU.
Raimundo tornou-se militar. Um homem de pedra com coração de manteiga. E o outro José, que fechou a conta.

Sebasto e Zé Grande – só esse “tiquim” – reencontraram João Silvestre e Maria Grande. Dessa vez, sem choro nem estradas poeirentas. Pois, tenho certeza de que, aonde quer que estejam, não há mais invernos nem verões. De lá ninguém arriba por precisão. No céu dos sertanejos, o muçambê viceja com sua fulô branca aberta o ano inteirinho. 

PS. Na ordem, da esquerda para direita, de cima para baixo: José Silvestre (Zé Grande), Sebastião Silvestre, Joaquim Silvestre, Antônio Silvestre, Afonso Silvestre, Luís Silvestre, Raimundo Silvestre e José Venilson Silvestre.














2 comentários:

  1. QDO VI AS FOTOS NA HORA RECONHECI MEU PAI, O VELHO QUINCO ELE TEM ESTA FOTO AINDA LÁ EM CASA...LINDO ATÉ ME EMOCIONEI!!!!!

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  2. Henrique, se eu já tivesse aprendido com segurança a diferença entre direita e esquerda, podia dizer sem medo de errar que tu tens os olhos do Sebastião Silvestre. Mas caso não tenha aprendido e tenha errado o chute, que fique claro: tu tens os olhos daquele lá de cima, com o bigode menor e com paletó sem estrela, como o do outro. Pronto. Tao bom ler o que você escreve. Eu queria ter nascido numa cidade do interior, como tu, onde as raízes da gente são mais claras. OBS: passei uma semana sem internet.

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